Literatura
Balada Literária traz pela 1ª vez a Salvador o escritor moçambicano Ungulani Ba Ka Khosa!

A Balada Literária da Bahia chega à quarta edição, entre os dias 14 e 17 de novembro, celebrando a força dos encontros artísticos e o poder político e transgressor da arte. Um dos participantes será Ungulani Ba Ka Khosa, escritor moçambicano, autor de Gungunhana: Ualalapi | As mulheres do Imperador, que estará pela primeira vez na Bahia. Ele participa da mesa “SEI DOS CAMINHOS” – MOÇAMBIQUE E BRASIL, dia 17 (sábado), na Casa do Benin (Largo do Pelourinho), às 19h. Confira entrevista feita pela Editora Kapulana:
Editora Kapulana – Você publicou Ualalapi em 1987, marcando o cenário da ficção histórica moçambicana. O que o fez escrever apenas recentemente As mulheres do Imperador, dando prosseguimento a Ualalapi?
Ungulani Ba Ka Khosa- As motivações por detrás de um livro estão, muitas das vezes, na esfera do imponderável: as vezes é uma ideia que surge, outras, uma paisagem, por vezes, uma frase, enfim, vários motivos. As mulheres do Imperador foram-me martelando a cabeça depois da edição do livro Entre as memórias silenciadas. Isto em 2013. Anunciei a intenção aos amigos mais próximos. E quis com o livro prestar uma singela homenagem às mulheres sempre secundarizadas na História maiúscula. Mas o livro não conseguia sair das primeiras três páginas. Faltava-lhe alma. Até então eu não conhecia o nome das mulheres do Imperador que regressaram a Moçambique depois de quinze anos de exílio. E andei à busca delas em tudo o que era arquivo em Moçambique. Estive em S. Tomé, terra em que elas passaram catorze anos e nove meses de exílio, e nada encontrei. E foi graças ao meu editor português, o João Rodrigues, que consegui ter os nomes das mulheres. Encontrei a alma. E o livro arrancou. Isto em 2016
E por ocasião dos trinta anos de Ualalapi, quis fechar o ciclo sobre o império de Gaza, trazendo à luz As mulheres do Imperador.
Editora Kapulana – Qual você acredita que pode ser a importância de republicar Ualalapi atualmente, para Moçambique?
Ungulani Ba Ka Khosa- Ualalapi tem, felizmente, tido edições sucessivas em Moçambique. É um livro de leitura obrigatória para os alunos do ensino secundário e médio e universitário. E tem, estoicamente, resistido ao desgaste do tempo. Isso satisfaz qualquer autor. O que falta ao Ualalapi é uma maior divulgação no exterior. Acabou de sair, ainda este ano, a edição americana –Ualalapi, fragments from the end of empire, pela prestigiosa editora Tagus Press, da Universidade de Massachusetts Dartmouth. Na colecção constam autores como Eduardo Lourenço, Luís de Camões, Eça de Queirós, Sophia de Mello Breyner, entre outros. É prestigiante. Aqui no Brasil, a editora Kapulana prepara uma edição conjunta com As mulheres do Imperador. Em Portugal já saiu a edição conjunta, o Gungunhana. Enfim, os bons ventos estão dando vida ao Ualalapi e As Mulheres do Imperador.
https://portalsoteropreta.com.br/iv-balada-literaria-da-bahia-homenageia-lazzo-matumbi-com-programacao-diversa/
Editora Kapulana – Um dos pontos mais reiterados por pesquisadores de suas obras literárias é o fato de suas narrativas não serem maniqueístas no tratamento dos personagens, negando a estrutura de heróis x vilões. Isto é uma preocupação sua durante a escrita?
Ungulani Ba Ka Khosa – Na verdade, pouco leio o que têm escrito sobre a minha obra. Sei de uma quantidade de teses e dissertações, para além de críticas avulsas que as leio na diagonal.
Quando escrevo, deixo-me levar pelo texto, pelos personagens. Não tenho um guião à priori. O tema do livro dá-me a estrutura e o movimento dos personagens. O que me ficou dos tempos de aprendizagem, ou seja, o meu mote, foi o de construir uma narrativa que tivesse por base os movimentos do cavalo: passo, trote e galope. Quero que o texto vibre como os tambores que ressoam pela noite adentro na savana tropical. O resto não me interessa.
Editora Kapulana – Se sim, qual a importância desta perspectiva, sobretudo em relação a uma figura histórica controversa como Gungunhana?
Ungulani Ba Ka Khosa –Tu queres tocar o Gungunhana. É provável que a tal perspectiva se encaixe no imperador. Mas quando escrevi sobre Gungunhana, em Ualalapi, tive em mente retratar a imagem do Gungunhana que sobrevive na história oral: um tirano, um invasor, um colonizador. Esta leitura difere da que é oficialmente veiculada: o grande herói da resistência anticolonial. O que de facto foi. Mas que não retira o seu lado tirano.
Eu enveredei por essa via da chamada tradição oral. Fiquei-me por aquilo que ouvi dos meus avós e outros da mesma geração.
Editora Kapulana -De que maneira a Literatura pode contribuir com a História, e especificamente com a História moçambicana?
Ungulani Ba Ka Khosa – Hoje é já um lugar comum estudar-se uma época e recorrer-se a literatura de então. Penso que a literatura vai além do preenchimento dos espaços vazios ou dos interstícios da História maiúscula; ela dá alma a uma época, humaniza um período histórico. Quando os alunos me perguntam como é que eu consegui retratar o Gungunhana daquela maneira, pensando eles que aquilo é verdade e não ficção, fico feliz porque a tal verosimilhança que os académicos tanto apregoam, deu certo. E quando isto acontece, a literatura sai a ganhar.
Editora Kapulana – Além desta obra, você publicou no Brasil (também pela Kapulana) um livro de contos (Orgia dos loucos) e um de literatura infantil (O rei mocho). Como autor, quais são as diferenças em seu processo de escrita para gêneros literários tão diversos?
Ungulani Ba Ka Khosa – O conto, gênero difícil porque ou se agarra no princípio ou se perde, é um grande gênero. E é necessário para quem se aventura na narrativa. Já o conto infanto-juvenil exige outro músculo. É um gênero a que não me atrevo a mergulhar de qualquer maneira. Corre-se sempre o risco de fazer trapaça. E muito do que por aí circula no gênero infanto-juvenil é texto de segunda categoria. É preciso ter uma grande alma para escrever um conto infanto-juvenil. Vou ancorando noutros portos da narrativa. Sinto-me seguro aí.
VEJA PROGRAMAÇÃO DA BALADA AQUI!
SERVIÇO
Evento: IV Balada Literária de Salvador
Quando: de 14 a 17 de novembro
Onde: Casa do Benin (Largo do Pelourinho)
Ingresso: Gratuito, com exceção do show Paralelas, com Alice Ruiz e Alzira E
Literatura
Ilustrador do subúrbio abre vaquinha para lançar cordel inspirado no mestre Moa do Katendê

Um super-herói negro, capoeirista e com fortes raízes na cultura afro-baiana é o protagonista de “A Lenda do Badauê”, obra ilustrada e independente do artista Eddy Azuos, morador de Paripe, no subúrbio ferroviário de Salvador. O projeto, voltado ao público infantojuvenil, mistura literatura de cordel com elementos do mangá e homenageia a capoeira e o legado de mestre Moa do Katendê, símbolo da resistência cultural e política no Brasil. Para viabilizar a impressão dos primeiros 100 exemplares do cordel, o autor lançou uma campanha de financiamento coletivo na plataforma Vaquinha. A ideia é distribuir o material, especialmente em espaços educativos, como forma de promover a cultura afro-brasileira e estimular o debate sobre identidade, preconceito e ancestralidade.
Super-herói de boina e sacolinha
Criado a partir da dor e da indignação provocadas pela violência política nas eleições de 2018 — especialmente o assassinato de mestre Moa —, o personagem de Eddy Azuos nasceu com traços fortes da identidade baiana: pele escura, cabelo dread, calça de capoeira e a icônica boina usada por Moa.
“Queria um herói preto, com nossa cara, que lutasse contra o mal”, explica o artista, que também é publicitário e designer.
O herói carrega uma sacolinha onde, segundo o autor, “podem estar seus poderes”. A história acompanha um grupo de moradores que, diante de um vírus que espalha ódio pela cidade de Salvador, recorre a uma lenda para invocar o Badauê e combater o mal.

Foto: Bruna Rocha
Capoeira, poesia e educação
Mais do que uma narrativa fantástica, o folheto é uma ferramenta educativa. Azuos pretende levar o cordel às escolas e estimular atividades que envolvam leitura compartilhada, debate sobre cultura e valorização da identidade negra. “O material fala contra o preconceito, sobre a capoeira, sobre a nossa cultura. Cita nomes de ruas, de golpes da capoeira, seria ótimo para trabalhar em sala de aula”, diz.
Inspirado por cursos de cordel e pela tradição oral, o artista optou por uma linguagem rimada, leve e acessível. “A poesia tira as pessoas daquela leitura maçante, prende pela métrica, pelos versos”, afirma.

Foto: Bruna Rocha
Publicação independente e desafios
Mesmo com o avanço de políticas públicas como a Lei 10.639/03, que prevê o ensino da história e cultura afro-brasileira nas escolas, obras com protagonismo negro ainda enfrentam barreiras no mercado editorial. A educadora e editora Ana Fátima, fundadora da Ereginga Educação, defende a importância de iniciativas como a de Azuos:
“Nossas crianças precisam se ver nas histórias como protagonistas. A literatura infantil afro-brasileira tem esse papel na construção da autoestima”, diz.
Ela destaca também a importância de autores independentes persistirem, mesmo diante das dificuldades. “Confie no seu processo criativo, busque leitores de confiança, faça cursos e participe de eventos literários. É possível romper com a hegemonia editorial”, aconselha.
Apoie o projeto
A vaquinha de Eddy Azuos está aberta para quem quiser apoiar a impressão de “A Lenda do Badauê”. Além de contribuir para a valorização da cultura baiana e da literatura negra, os apoiadores ajudam a colocar nas mãos de crianças e adolescentes uma história de resistência, afeto e identidade.
🔗 Acesse a vaquinha e saiba como apoiar clicando AQUI.
Fonte da reportagem: EntreBecos
Literatura
Editora Organismo celebra 12 anos com foco na literatura negra e independente

A Editora Organismo celebra seus 12 anos de atuação em 2025. Fundada de forma independente no bairro da Liberdade, em Salvador, a editora consolidou seu papel como uma das iniciativas voltadas à democratização do acesso à literatura negra e periférica.
Desde sua criação, a Organismo já publicou mais de 120 títulos, sendo mais de 80% de autoria negra, com protagonismo de mulheres. Suas obras já foram finalistas dos prêmios Jabuti e Oceanos, indicadas em vestibulares como o da UNEB e traduzidas internacionalmente, ampliando o alcance das narrativas negras brasileiras. Para marcar a data, a editora promove uma programação especial gratuita na Biblioteca Pública do Estado da Bahia, reunindo autores, músicos e pesquisadores, e abrindo espaço para novos debates sobre a literatura negra contemporânea.
O lançamento do livro Modernismo Negro, de Jorge Augusto — poeta, professor e fundador da Organismo —, acontece no dia 17 de abril, às 19h. A obra propõe uma releitura da modernidade brasileira a partir de vozes negras e periféricas, tomando como referência a literatura de Lima Barreto. O livro é parte da coleção “NaEncruza”, publicada pela Editora Segundo Selo, braço editorial da Organismo.
O evento de estreia contará com pocket show de Silvana Carvalho e Daniel Santana, leitura de trechos da obra e um bate-papo com o autor e os convidados Fernanda Miranda, Henrique Freitas e Osmundo Pinho, com mediação da escritora Vânia Melo.
Encerrando as comemorações, no dia 22 de abril, será realizada a roda literária “Ciranda DasPretas: outros versos da Bahia”, com a presença das escritoras Silvana Carvalho, Anajara Tavares, Vânia Melo, Kota Gandaleci e Patrícia Silva. A mediação será feita pela professora Ana Carla Portela. O encontro celebra o legado coletivo e a força da escrita negra feminina baiana.
Publicar mulheres e jovens periféricos
De acordo com Jorge Augusto a ideia da editora ao perceber que, enquanto jovem negro periférico, não encontraria acolhimento nos veículos editoriais que existiam aquela época.
“não imaginava que algum jornal ou revista fosse publicar um bando de jovens periféricos que imaginavam que tinham coisas importantes a dizer sobre a literatura e a cidade”, afirma Augusto.
O escritor explicou que a proposta inicial era criar um circuito mais democrático de publicações, com revistas mais acessíveis para pessoas que, como ele, não se identificavam nem queriam fazer parte de uma cena literária tradicional já estabelecida. Foi com esse objetivo que surgiu a editora, acompanhada da revista Organismo e da coleção Novos Autores.
No entanto, segundo ele, logo ficou evidente que a demanda era muito maior do que o previsto, especialmente no que diz respeito à necessidade de publicações voltadas para autores negros e periféricos. A partir dessa constatação, decidiram criar a Editora Segundo Selo, como um braço editorial da Organismo. Com isso, houve uma mudança significativa na atuação da editora, que passou a publicar mais títulos, mantendo o compromisso com segmentos historicamente negligenciados pelas grandes editoras.
A editora Segundo Selo enfrenta obstáculos estruturais que dificultam sua atuação. A ausência de um parque gráfico competitivo no estado obriga a impressão dos livros em outras regiões, como São Paulo e Rio de Janeiro, gerando altos custos logísticos e perda de recursos locais.
Segundo Fernanda Santiago, sócia e editora, além do impacto financeiro, essa realidade compromete a autonomia da produção editorial baiana. Participar de eventos também não é tarefa simples — muitas vezes, a editora é deixada de fora, e quando incluída, ocupa espaços pouco acessíveis ou com baixa visibilidade.
O catálogo da Segundo Selo é composto majoritariamente por mulheres negras, o que expõe outro desafio: a dificuldade de inseri-las em grandes eventos literários. Fernanda aponta que autoras negras ainda são tratadas como exceção, e frequentemente, uma única escritora é escolhida como representante de um universo muito mais amplo e diverso.
Ela também questiona a aplicação de recursos públicos em eventos que pouco valorizam editoras independentes. “Somos nós que descobrimos grandes escritores, que investimos e acreditamos na potência do que é produzido não só por autores baianos, mas por escritores negros e periféricos”, afirma.
Apesar das barreiras, Fernanda reconhece que editais mais recentes têm sinalizado avanços no fortalecimento dessa produção, fruto de anos de resistência e articulação.
SERVIÇO
Agenda comemorativa – 12 anos da Editora Organismo
Local: Biblioteca Pública do Estado da Bahia (Barris)
Horário: 19h
Entrada gratuita
17 de abril (quinta-feira)
Lançamento do livro “Modernismo Negro”, de Jorge Augusto
Pocket show: Silvana Carvalho e Daniel Santana
Leitura e bate-papo com convidados: Fernanda Miranda, Henrique Freitas e Osmundo Pinho. Mediação: Vânia Melo.
22 de abril (terça-feira)
Ciranda DasPretas: outros versos da Bahia
Com: Silvana Carvalho, Anajara Tavares, Vânia Melo, Kota Gandaleci e Patrícia Silva. Mediação: Ana Carla Portela.
Literatura
Midiã Noelle lança “Comunicação Antirracista” em Salvador

O livro “Comunicação Antirracista: um guia para se comunicar com todas as pessoas, em todos os lugares”, da jornalista e pesquisadora Midiã Noelle, chega a Salvador, sua terra natal, após estrear em São Paulo e passar por Brasília. O evento ocorre neste sábado (5), às 15h, na livraria LDM do Vitória Boulevard, no Corredor da Vitória, com mediação da jornalista Val Benvindo.
Publicado pela Editora Planeta, o livro propõe reflexões urgentes sobre como construir uma comunicação mais inclusiva e livre de preconceitos — indo além das redações e alcançando escolas, empresas, redes sociais, campanhas políticas e todos os espaços de convivência. Além dos lançamentos já realizados em São Paulo e Brasília, a agenda da autora inclui eventos confirmados em Nova York (EUA), como parte do evento Diálogos Antirracistas, promovido pelo projeto Seta, além de agenda prevista para o mês de maio em Recife e Rio de Janeiro.
Sobre o livro
Comunicação Antirracista é um guia acessível que apresenta caminhos e estratégias para tornar a comunicação cotidiana uma aliada da justiça racial. Midiã Noelle articula suas vivências pessoais e profissionais à sua formação acadêmica para traduzir o conceito de antirracismo de maneira prática e transformadora.
Com apresentação da pesquisadora e ativista afrodiaspórica Carla Akotirene, prefácio de Ana Flávia Magalhães Pinto, e quarta capa de Barbara Carine e Rosane Borges, a obra aborda temas como a deslegitimação histórica da população negra na comunicação, o impacto das narrativas racistas e a necessidade de ressignificar a forma como nos comunicamos.
Sobre a autora
Nascida no bairro da Liberdade, em Salvador, Midiã Noelle é mestra em Cultura e Sociedade pela Universidade Federal da Bahia e fundadora do Instituto Commbne. Atua há mais de 15 anos com comunicação estratégica em organizações do movimento negro, feminista, em agências das Nações Unidas e na gestão pública.
Foi reconhecida como uma das Mulheres Inspiradoras pela Think Olga (2016) e uma das 100 pessoas negras mais influentes dos países de língua portuguesa pelo prêmio Bantumen Powerlist 100 (2021).
Serviço
O quê: Lançamento do livro “Comunicação Antirracista” em Salvador
Quando: 5 de abril (sábado)
Horário: 15h
Onde: Livraria LDM do Vitória Boulevard – Corredor da Vitória, Salvador/BA
Mediação: Val Benvindo
Entrada: Gratuita