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Entrevista: “se for uma mulher negra, é melhor ainda”, diz Vovô do Ilê sobre pré-candidaturas negras à Prefeitura de Salvador!

Citado como possível candidato a prefeito de Salvador pelo presidente do seu partido, o PDT, o presidente e fundador do bloco afro Ilê Aiyê, Antônio Carlos dos Santos, conhecido como Vovô do Ilê, abriu a série de entrevistas do Portal Mídia 4P com os pré-candidatos negros à corrida pelo comando do Palácio Thomé de Souza. Até então, além de Vovô, já lançaram oficialmente seus nomes para o posto a socióloga e militante do movimento de mulheres negras Vilma Reis, filiada ao PT, o vereador de Salvador Moisés Rocha (PT) e o deputado federal do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra Valmir Assunção (PT). A deputada estadual Olívia Santana (PCdoB) e o vereador de Salvador Sílvio Humberto (PSB) também foram convidados para a série de entrevistas.
Embora não tenham lançado suas pré-candidaturas, ambos são postulantes naturais dentro das suas legendas à Prefeitura e não escondem o desejo de disputar o comando do Executivo Municipal soteropolitano. O presidente do PSOL Bahia, o sociólogo Fábio Nogueira, informou à reportagem que a sigla não tomou definição sobre o pleito do próximo ano. Além disso, nenhum nome da legenda colocou-se publicamente como pré-candidato, até então. Por isso, nenhum quadro do partido foi convidado.
Outros pré-candidatos negros que por ventura coloquem seus nomes na disputa pela Prefeitura, mesmo que isso aconteça após o início das publicações, também serão convidados a dar entrevista para esta série, que tem o objetivo de dar voz a essas lideranças políticas de Salvador. A estreia das rodadas de bate-papo é com Vovô do Ilê, que falou sobre as possibilidades reais de ser candidato, fez avaliação sobre a unidade do movimento negro para as eleições municipais de 2020 na Cidade da Bahia e listou as dificuldades de concretizar o antigo sonho de ter um prefeito negro eleito na capital baiana.
MÍDIA 4P – O presidente do PDT falou sobre a possibilidade da candidatura do senhor à Prefeitura de Salvador e gerou muito burburinho. Você confirmou que seu nome está à disposição e é um dos maiores defensores de que a cidade tenha um prefeito negro. Como o senhor está trabalhando essa possibilidade em relação ao seu nome? Acha que é concreto?
Vovô – A minha ideia vem desde 2006. Desde que eu me entendo que eu estou no movimento negro, venho pensando nisso. Mas em 2006, concretamente, na Noite da Beleza Negra, na Codeba, durante a premiação, no discurso, eu falei isso: “Eu quero ela”. Tomaram um susto, muita gente achando que era alguma mulher, mas eu falava da cidade, que eu quero o poder dessa cidade, que eu quero um prefeito ou uma prefeita negra. Eu sei que os meninos fizeram música, teve um ótimo Carnaval com o tema, criaram umas camisas, mas o tempo foi passando e não saiu nada de concreto. E agora, desde 2016, com os acontecimentos no Carnaval, a falta de patrocínio, as dificuldades, o tratamento diferenciado que dão para os artistas brancos e negros, que eu venho falando isso. Em 2018, voltamos a falar dessa possibilidade e começamos a nos reunir aqui em Alaíde (Restaurante Alaíde do Feijão, no Pelourinho) para centrar os votos em um prefeito ou uma prefeita negra. Uma cidade negra não pode continuar com um poder branco. Aí saímos no 2 de julho, colocamos os tambores na rua, fizemos camisas, e agora vamos fazer um seminário para discutir isso. Semana passada, no lançamento de uma cartilha de Abdias, lá na Senzala (do Barro Preto), um grupo do PDT sugeriu o lançamento do meu nome.
Eu sempre falei desse desejo de ter uma prefeita ou prefeito negro no poder, mas não necessariamente que seja eu. Já fui candidato a vereador em 1988 e na época nós tínhamos possibilidade. Se tivesse voto eletrônico, talvez tivesse ganhado, porque muito voto foi desviado etc. Mas isso é o passado.
MÍDIA 4P – Mas objetivamente qual a possibilidade concreta? O partido te procurou, está conversando?
Vovô – Não teve nenhuma conversa com o partido. O presidente do diretório do partido se manifestou, achou interessante meu nome, como agregador, mas só isso. Mas eu continuo dizendo que sei que meu nome pode agregar e fortalece a causa, mas tenho a expectativa de que haja possibilidade de outros nomes. Não necessariamente que seja eu.
MÍDIA 4P –E para ser o seu o nome do candidato precisa de que? Quais caminhos precisam ser trilhados?
Vovô – Primeiro, vontade minha. Eu não estou com vontade de ter essa responsabilidade, esse compromisso. Não que eu seja de fugir da raia, mas na minha cabeça a possibilidade sempre foi de uma Olívia, uma Vilma Reis, um Moisés Rocha, um Suíca, um Silvio Humberto, principalmente o pessoal que tem mandato. Eu estava sempre trabalhando com essa possibilidade. Surgiu meu nome, mas eu ainda não estou convencido de que tem que ser eu.
MÍDIA 4P – Essas articulações estão acontecendo na cidade em diversos espaços, seja em Alaíde, seja em outras reuniões para pensar a eleição. Como o senhor avalia os nomes que já estão colocados?
Vovô – Eu sempre defendi isso. O Ilê colocou o tema “O negro e o poder” e meu nome foi citado outras vezes, em outros estados, até para deputado. Mas eu nunca tive essa ganância. Existem outras formas de poder, mas o poder partidário é muito importante, muito forte. Numa cidade com essa maioria, em média 80%, negra, todo mundo espera que esse grito de liberdade parta daqui da Bahia. Independente de quem seja o nome
MÍDIA 4P –Todo mundo critica os partidos pelas dificuldades de se financiar campanhas negras. O senhor acha que é possível em 2020 romper esse racismo e ter uma campanha competitiva?
Vovô – Se a gente tiver menos vaidade, e se a gente realmente centrar na proposta e começar a socializar mais, a fortalecer essa proposta, eles vão ter que parar, sentar e nos chamar para conversar. Vão ver a força que nós temos. Quando o povo negro começar a declarar que a tendência é votar em um candidato negro, os partidos, eles não são bobos nem nada, vão ter que parar para conversar, porque senão vamos continuar sendo apenas candidatos para fazer quociente eleitoral de partido. Sempre aquela enganação, enganação, e vai sair mais um candidato a prefeito e a prefeita branco para mandar na negrada.
Se o povo negro de Salvador, se o povo que se diz consciente, os grupos dos bairros, de mulheres, de homens, se juntarem, deixar de achar que os mais velhos querem mandar, se nos juntarmos com um objetivo… Hoje você chega em qualquer gabinete e só tem branco. Em gabinete de qualquer setor de governador, de prefeito, de senador, de deputado, e só tem branco. Se eles não são negros também, fica mais difícil. Então é preciso ter essa black atitude. Precisamos parar o discurso e partir para a atitude mesmo.
MÍDIA 4P – As mulheres negras reivindicam o espaço legítimo de ter uma candidata a prefeita negra também. E vários nomes são cogitados. Mas vários homens lançaram candidatura também, inclusive o senhor. Com o senhor analisa esse cenário?
Vovô – A proposta nossa lá do ‘Eu quero ela’ é essa. Por isso que não pode ficar centrado no nome de Vovô. Tem que esperar chegar mais perto, quando afunilar, parar e ver o que é melhor pra gente. Olívia é uma possibilidade viva aí. Já tem mandato, experiência política, só basta ter a atitude de ou encarar o partido ou mudar para um partido nanico e a gente vai respaldar. Se a gente for pra cima, a gente vira essa mesa. Tem que ser um prefeito ou uma prefeita negra. Não tem essa coisa de que tem que ser homem, de que tem que ser mulher. Tem que ser uma pessoa negra. Se for uma mulher negra, eu acho que é melhor ainda.
MÍDIA 4P – Qual a diferença que fará a eleição de um prefeito negro em Salvador?
Vovô – Vai fazer uma diferença enorme, 360 graus, 400 graus, 600. Não dá para medir a dimensão disso, da importância disso. Imagine o impacto que foi em 1974, em plena ditadura, a gente fundar o Ilê Aiyê. Aquela pressão. Agora, a gente conseguir ter um prefeito, um comandante negro, seria lindo. Hoje você vê cidades americanas com 18% da população negra, com 8%, que tem prefeitos negros. Tem o exemplo de Chicago agora, que a ‘negona’ é homossexual e negra. Mas uma coisa que precisamos deixar bem claro é que nós não queremos só o voto dos negros não. Queremos o voto dos brancos. A prefeita ou prefeito não vai governar só para os negros, vai governar para a cidade. Então é importante também as pessoas que não são racistas se envolverem. Precisamos envolver a cidade toda. A cidade precisa mostrar sua verdadeira cara. No seminário, no dia 9, não vão ter só pessoas negras, porque precisamos envolver a cidade, radicalizar, pedir os votos e pedir que as pessoas se conscientizem.
MÍDIA 4P – O movimento negro tem diversas instituições, matizes, organizações. Existem os conflitos. O senhor acha que é possível conseguir unidade?
Vovô – Sempre tem as pessoas mais radicais, mas temos que pensar que a questão não é gostar de mim ou de Olívia, mas é a causa. Temos que pensar no futuro, no futuro dos seus filhos, dos seus netos, no amanhã, no exemplo que você vai dar pra essa cidade, para essa cidade ficar mais negra, mais charmosa, menos perversa. Então está na hora de deixar essas arestas de lado, aparar essas arestas, e ir em busca.
Não adianta dizer que faz trabalho aqui e ali mas não conseguir se juntar. Como diz a música, “vamos nos unir para se somar, jamais dividir, só multiplicar”. Está na hora da gente interpretar essas músicas dos blocos afros.

Foto: Sora Maia/CORREIO
MÍDIA 4P – A Bahia já mandou para o Brasil muito político negro de direita, que não eram do movimento negro, e que até eram de igrejas evangélicas. Qual a importância de ter um candidato negro que tenha, além da pele, uma cabeça voltada para a questão racial?
Vovô – Nós temos que pensar que o país é laico. Tem evangélicos que você consegue discutir com tranquilidade sobre essa questão. O primeiro dinheiro que eu consegui para a sede do Ilê Aiyê foi de um pastor evangélico. Na época, eu fui muito criticado, porque minha mãe era de um terreiro tradicional, eu de candomblé. Mas deixamos a questão religiosa de lado e fomos discutir a negritude. Subi esse Brasil com Reginaldo Germano, ele foi lá e se posicionou, teve o voto de muita gente de terreiro. Mas foi muito duro também as porradas que eu recebi. Mas ele fez a parte dele. Então é possível sim dialogar com outras religiões.
MÍDIA 4P – Qual a maior dificuldade de concretizar o plano de uma prefeita ou prefeito negro?
Vovô –Conscientizar e mobilizar nosso povo. O grande desafio é esse. Além da dificuldade financeira, que já é normal, a maior dificuldade está em nós, em saber usar o direito do voto com dignidade e com certeza. O grande desafio é convencer essa roma negra para ela mostrar realmente a sua verdadeira cara.
MÍDIA 4P – E de todos os candidatos negros que estão colocados, quem Vovô do Ilê acha que tem mais chance de ganhar caso seja candidato?
Vovô – Ainda não dá para definir isso. Ainda tem um tempo. Eu não estou fugindo da raia, coloquei meu nome à disposição, pela popularidade, mas eu gostaria que tivesse uma candidata que não fosse eu.
Eu quero participar, dar essa impulsionada, vou estar sempre junto, mas se tiver alguém com mais gás, com mais força, mais preparado ou que consiga atrair o voto ainda mais, da minha parte não tem problema nenhum.
Entrevista concedida originalmente ao repórter Yuri Silva para o Portal Mídia 4P, publicado em 02 de ago de 2019. Acesse aqui!
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Raquel Virgínia participa de encontro com pessoas trans terça (28)

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Ilê de Luz com a Neoenergia Coelba na Senzala do Barro Preto

A Senzala do Barro Preto recebeu, na manhã da última quarta-feira (22), às 10h, personalidades da música baiana, influenciadores digitais da moda, da cultura e do entretenimento, além de representantes da gestão cultural do estado e representantes do Governo Federal da cultura para a assinatura de parceria entre o Bloco Afro Ilê Aiyê e a Neoenergia Coelba. O evento teve como objetivo fortalecer os projetos do primeiro bloco afro do Brasil durante todo o ano de 2025 através de oito iniciativas culturais.
A parceria foi assinada por Thiago Guth, diretor presidente da Neoenergia Coelba e por Antônio Carlos dos Santos, conhecido como Vovô, presidente fundador do Bloco Afro Ilê Aiyê. Estavam presentes a Ouvidora Geral da Bahia, Arany Santana, a coordenadora geral do Centro de Culturas Populares e Identitárias (CCPI), Cristiane Taquari, a presidenta da Fundação Nacional de Artes (Funarte), Maria Marighella, além da sacerdotisa do Ilê Axé Jitolá, Doné Hildelice Benta e a artista plástica, diretora e estilista do Ilê Aiyê, Dete Lima e de Ângela Guimarães, Secretária Estadual de Promoção da Igualdade Racial e dos Povos e Comunidades Tradicionais (SEPROMI).

Foto: Fabrício Rocha / Estúdio Casa de Mainha
“Pra nós do Ilê, é um momento muito especial ter essa parceria da Neoenergia neste ano em que completamos 50 anos de existência, dando uma contribuição muito grande no período em que o Ilê teve a ousadia de se firmar e se afirmar neste resgate do orgulho de ser negro. Hoje sinto que as coisas estão mudando. Eu estou sempre cobrando, reclamando e eu quero muito mais. Agradeço ao pessoal da Neoenergia, parabenizo todos os setores governamentais, municipais, estaduais e federais neste momento em que celebramos 40 anos da Axé Music, mas ninguém lembra que esse estado é negro, na cidade mais negra fora da África e com um bloco afro que completa 50 anos. Precisamos lembrar sempre isso para que a nossa cidade seja menos racista e nos aceitar”, finalizou Vovô.
Quem esteve presente durante a assinatura de parceria na Senzala do Barro Preto foi DJ Branco, gestor da Casa do Hip Hop Bahia, que enfatizou a importância da chegada na Neoenergia no bairro do Curuzu, ajudando a capacitar a comunidade do bairro para sua inserção no mercado de trabalho soteropolitano. Para ele, “essa ação vai contribuir automaticamente para o desenvolvimento social, político, cultural e econômico desse lugar, com expressiva representatividade negra em Salvador”, afirmou.

Foto: Fabrício Rocha / Estúdio Casa de Mainha
Entre os projetos apoiados no primeiro trimestre estão o Festival de Música Negra, a 44ª Noite da Beleza Negra e o desfile de Carnaval. A parceria celebra os mais de 50 anos do Ilê Aiyê como um dos maiores representantes da cultura afro-brasileira, enaltecendo a ancestralidade africana e o protagonismo das mulheres negras. Para a Neoenergia Coelba, o patrocínio ao Ilê Aiyê é um marco que converge com seus valores corporativos, promovendo inclusão e cidadania em comunidades historicamente marcadas pela luta por direitos.
“Estou muito feliz hoje, presente nesse momento de parceria entre o Bloco Afro Ilê Aiyê e a Neoenergia Coelba. Para nós, esse momento representa o fortalecimento de um trabalho pautado em ações afirmativas que a gente já implementa na nossa empresa desde 2021, se estruturando em espaços como a Senzala do Barro Preto, que são tão importantes para a nossa cidade e para nosso povo negro”, declarou Dejeane Lima, colaboradora da Neoenergia e membro do Grupo de Afinidade e Raça da empresa.
Além de apoiar os projetos e eventos do Ilê em 2025, a Neoenergia Coelba levará à comunidade do Curuzu ações de impacto social e de empregabilidade, com o propósito de ir além do aporte financeiro, promovendo serviços, projetos educativos e formação profissional para a comunidade no entorno da Associação da Senzala do Barro Preto.
Entre as iniciativas, destacam-se:
- Escola de Eletricistas: capacitação técnica gratuita para mulheres e homens, promovendo inserção no mercado de trabalho. A ideia é facilitar a entrada de jovens e adultos que integram os programas sociais do Ilê Aiyê nas turmas de capacitação;
- Programa Potencialize: programa interno de aceleração de carreira para talentos negros da Neoenergia Coelba. A intersecção com o Ilê Aiyê possibilita que a equipe da Neoenergia se beneficie com o saber do Ilê nas questões de raça e etnia, assim como a possibilidade de mentorias para os jovens profissionais do Curuzu;
- Programa Jovem Aprendiz: qualificação profissional para jovens em início de carreira e oportunidade do primeiro emprego, fundamental para abrir as portas para o mercado de trabalho;
- Neoenergia em Ação: iniciativas sociais voltadas para a educação e conscientização sobre o uso seguro e eficiente de energia, além de serviços públicos;
- Junt+s: Programa de diversidade e inclusão da Neoenergia Coelba, que inclui um grupo de afinidade voltado para as questões de raça e etnia. É focado em promover um ambiente de trabalho de respeito às diferenças, empoderamento e combate ao preconceito;
- Segurança com a rede elétrica: formação de embaixadores de segurança na comunidade, workshops sobre energia e segurança no Carnaval, além de ações de orientações em espaços comunitários para a prevenção de acidentes;
- Eficiência Energética: Realização do projeto Energia com Cidadania no Curuzu e ações educativas sobre o uso racional e eficiente da energia para a comunidade.
“Para a Neoenergia Coelba, patrocinar o Ilê Aiyê é reafirmar nosso compromisso com a valorização da cultura, da identidade e do protagonismo negro, pilares essenciais para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva. Juntos, reforçamos a importância da cultura afro-brasileira e criamos oportunidades reais de transformação social nas áreas onde atuamos”, destacou o diretor-presidente da Neoenergia Coelba, Thiago Guth.
O Ilê Aiyê, que desde 1974 transforma arte e música em instrumentos de luta e expressão, celebra a parceria como um passo importante para a continuidade e ampliação de seus projetos.
Curuzu e energia criativa profissionalizante
Essa parceria, que conta com parte do investimento viabilizado pela Lei Federal de Incentivo à Cultura (Lei Rouanet), ressalta o compromisso de unir tradição, cultura e responsabilidade social, fortalecendo o legado do Ilê Aiyê e ampliando o impacto positivo da Neoenergia Coelba na Bahia.
Entre as iniciativas contempladas com o patrocínio estão os desfiles do bloco durante o Carnaval, a Escola Mãe Hilda, que promove educação antirracista, e o projeto Band’Aiyê, que conecta a música do Ilê às novas gerações. Seguem exemplos de eventos e iniciativas do Ilê para 2025:
- Projeto Band’Êre: Escola de Percussão, Canto e Dança para crianças e adolescentes com aulas de História Afrobrasileira, Interpretação e Linguagens, Ritmos Musicais e Saúde do Corpo;
- Festival de Música Negra: Concurso de música em que os finalistas ganham o Troféu Pássaro Preto e as canções vitoriosas passam a integrar o repertório do carnaval;
- Noite da Beleza Negra: Concurso cultural que destaca a beleza negra, incluindo apresentações de dança e música e marca a escolha da rainha do bloco no Carnaval, a Deusa do Ébano;
- Caminhada da Liberdade: Evento organizado em parceria com o Fórum de Entidades Negras da Bahia, sendo um manifesto contra o racismo e a celebração da cultura negra.
O produtor, fotógrafo e agitador cultural, Uran Rodrigues, marcou presença na Senzala do Barro Preto ao lado das influenciadoras de moda e comportamento, Najara Black, da marca de roupas N Black e da psicóloga e influenciadora, Fernanda Evan, conhecida como Preta Evan em suas redes sociais.
Amigo e parceiro dos projetos do Bloco Afro Ilê Aiyê, o diretor baiano da Caderno 2 Produções, Dalmo Peres, trabalha na assessoria das ações culturais e posicionamento de marca do Ilê Aiyê há 25 anos. Para ele, é um grande prazer e um grande orgulho a chegada da Neoenergia Coelba para patrocinar o Plano de Ações Culturais Anual do Ilê. “É mais do que um patrocínio, eles serão os mantenedores desse Plano Anual do Ilê, então pra gente é muito significativo esse momento por ser uma nova etapa que o Ilê está entrando neste contexto da Lei Rouanet, agradecendo ao Ministério da Cultura, a Funarte e agradecer a todas instâncias do Governo do Estado e da Prefeitura. Neoenergia Coelba, seja bem-vinda ao Ilê Aiyê”, comemorou Dalmo Peres.
O Curuzu, por muitos anos, foi conhecido como uma rua do bairro da Liberdade. Sempre foi confuso informar onde se morava. Porém, desde 2017, o Curuzu foi incluído na lista de bairros oficiais de Salvador por sua força e representação. Com uma população de mais de 23 mil habitantes, a região concentra becos, ruelas e travessas. A Lei 8.313/1991, conhecida por Lei Rouanet, é o normativo federal que institucionalizou o incentivo à cultura, por meio da criação do Programa Nacional de Apoio à Cultura – Pronac, de responsabilidade do Ministério da Cultura – MinC.
Patrícia Bernardes Sousa é jornalista, redatora e integra projetos de impacto social, letramento, educação e cultura e é colaboradora do Portal Soteropreta.
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Caso Anhamoná Brito: advogada buscará reparação na Justiça e pedirá indenização à Gol

Na manhã desta quinta-feira (19/12), a advogada, ativista de Direitos Humanos e professora da UNEB, Anhamoná Brito denunciou um caso de injúria racial sofrido no Aeroporto de Congonhas (SP), quando se direcionava à 15ª Reunião Ordinária do Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento da Política Nacional para População em Situação de Rua (CIAMP-Rua Nacional), onde faria uma apresentação.
Em relato divulgado nas redes sociais logo após o ocorrido, Anhamoná afirmou ter sido perseguida e xingada por uma atendente da empresa Gol Linhas Aéreas ao longo do saguão, após ter utilizado o banheiro destinado ao uso preferencial de pessoas com deficiência por estar se sentindo mal no momento.
A advogada relatou ter sido xingada de nomes de baixo calão e ter ouvido que “tudo para esse povo é racismo”, após ter questionado a atendente se o comportamento dela estava pautado por um viés racial. Leia o relato:
“Saí do voo G31525 não me sentindo muito bem. Na área de desembarque, o banheiro feminino comum estava cheio. Fui a um prioritário, que não é exclusivo, porque estava me sentindo muito mal. Quando saí, fui abordada por uma profissional que estava acompanhando uma mulher com deficiência, ao invés de perguntar qual motivo de eu acessar aquele banheiro, começou a gritar comigo. Ela começou a me perseguir e gritar pelo aeroporto, com intuito de me fazer parar e talvez entrar no jogo dela. Quando eu a abordei, de maneira educada, mas objetiva, e perguntei se aquela conduta dela não estava eivada de preconceito racial, se não era uma postura racializada, ela começou a me xingar, de maneira bastante jocoso, de cachorra, de puta e outros termos, com intuito inclusive, no meu entendimento, de conseguir mais adeptos, já que nós não podemos falar que somos vítimas de violência racial”.
ADUNEB emite Nota Pública em apoio à professora
Após o acontecimento, Anhamoná, que foi a primeira Ouvidora da Defensoria Pública do Estado da Bahia no período de 2009 a 2011, buscou atendimento junto a superiores in loco da Gol, os quais se negaram a fornecer o nome da atendente e a proceder com os trâmites, tentando “diminuir o acontecido, dizendo que apenas havia sido um excesso da funcionária”, disse em seu relato. Na ocasião, a princípio, foi encaminhada pela supervisora da empresa apenas à Ouvidoria para registro de reclamação.
Como lida diariamente, em seu fazer jurídico e acadêmico, com as relações raciais e crimes vinculados à raça, Anhamoná registrou o caso de injúria racial na 2ª Delegacia de Atendimento ao Turista, ainda no Aeroporto.
Após a repercussão do caso, em nota, a Gol informou que “após checagem com câmeras internas do aeroporto de Congonhas, averiguou-se que o diálogo relatado pela passageira no vídeo publicado nas redes sociais não se deu com funcionária da Companhia, mas sim com a de uma empresa terceirizada que não presta serviços para a GOL. Disse ainda que “a Companhia entrou em contato com a passageira para prestar apoio e esclarecer os fatos e se mantém à disposição das autoridades que apuram a ocorrência”.
UNEB emite Nota de Apoio a Anhamoná Brito
Segundo Anhamoná, esse posicionamento da Gol, que fez contato com ela ainda ontem (19/12), após repercussão, “a responsabilidade da Gol não se esvai em hipótese de abusividade praticada por terceirizados. Ao contrário, a empresa assume objetivamente. Questionei à atendente sobre o nome e a vinculação real da funcionária e a preposta de quem me ligou foi de que não sabia responder. Questionei ainda, por telefone, à preposta da Gol, sobre a posição da empresa com relação ao atendimento que a mim foi dirigido pela supervisora no Aeroporto, que não quis acolher a minha reclamação, uma conduta profissionalmente incompatível ou constrangimento de qualquer ordem”, diz.
Sobre a conduta da supervisora, a resposta que a preposta da Gol deu à professora foi a de que a empresa iria verificar e dar uma posição formal por e-mail, assim como aos pedidos de informação sobre a funcionária agressora, local de atividade e empresa à qual estava vinculada. Até o fechamento desta matéria, Anhamoná não recebeu qualquer notificação da Gol.
Não ficará por aí…
Considerando ser este caso – como de outros recentes acontecidos em Aeroportos, como o caso de intolerância religiosa contra a Egbomi Lindinalva Barbosa (Terreiro do Cobre/Salvador) acontecido em Fortaleza no último dia 1 – um episódio que não pode ser deixado apenas como “reclamação junto à empresa”, a professora Anhamoná judicializará o caso, e será representada pelo advogado Hédio Silva Jr., que possui ampla experiência nas áreas do Direito Constitucional e Processual Penal. Foi Secretário de Justiça e Cidadania do Estado de São Paulo, e se destaca com grande influência no campo jurídico brasileiro, já tendo atuado em diversas ações contra empresas aéreas, como por exemplo em ações da atriz, Luana Xavier, que já foi “humilhada no portal do Raio X n vezes”, segundo o advogado.
“Mesmo sendo advogada, ativista de direitos humanos e da luta antirracista, escolhi o Dr. Hédio Silva Júnior para me representar por sua ampla experiência em processos que envolvem companhias aéreas e o próprio sistema aeroportuário no país, em situações de crimes e práticas abusivas que refletem o racismo em nossa sociedade. Hédio é um importante expoente na esfera do Direito das relações raciais, com muitas contribuições no aperfeiçoamento da gestão pública e no combate a abusividades decorrentes do racismo”, pontua Anhamoná.
Para Hédio, a situação é lamentável, recorrente e precisa ser investigada. “Lamentavelmente não são poucos os problemas que passageiros negros tem em Aeroportos no Brasil, e não são raros. A ação principal vai ser contra o Ministério de Portos e Aeroportos, a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), a Gol Linhas Aéreas e a prestadora de serviços da Gol. Uma ação que vai pedir ao Judiciário que obrigue essas empresas a adotarem protocolos que preservem passageiros negros de situações como estas que são, lamentavelmente, frequentes. Essa será uma Ação de Obrigação de Fazer e Indenizatória para adoção de protocolo de respeito à diversidade racial e religiosa. E, certamente, a depender do que surja das investigações das imagens, uma ação criminal contra a terceirizada, quem quer que seja, que perpetrou crimes contra Anhamoná de constrangimento ilegal e de injuria racial”, explica Hédio Silva Júnior.
Políticas públicas
É crescente, nos últimos anos, casos de injúria racial, intolerância religiosa e racismo cometidos contra passageiros negros e negras nos Aeroportos em todos os estados, o que reafirma a necessidade premente de se reavaliar e fiscalizar os critérios utilizados nas inspeções aleatórias, além de deixar transparente os procedimentos de segurança, e primar pelo respeito a todos os usuários, independentemente da diversidade de corpos, raça, gênero ou religião.
Para o Mestre em Políticas Públicas e Governo (FGV), e ex-Secretário do Sistema Nacional de Igualdade Racial, Yuri Silva, a recorrência destes tipos de caso deixa visível a necessidade de haver uma responsabilização maior das empresas quanto à qualificação de seus profissionais e a devida reparação às vítimas.
“Esses tipos de caso têm sido recorrentes, dado alguns exemplos que vimos noticiados recentemente. Tem uma concentração de casos que diz respeito à responsabilidade das companhias, como agentes comerciais desse serviço aéreo nacional. E elas precisam ser responsabilizadas pelos casos ocorridos, além de serem obrigadas a reparar as vítimas e a colocar em prática protocolos anti-discriminatórios. Mas também há uma responsabilidade de regulação do serviço aéreo nacional. Então, a criação de protocolos é uma pauta que vem sendo discutida nos últimos dois anos, que pude acompanhar quando ocorreram outros casos envolvendo companhias aéreas, inclusive com atuação da Polícia Federal. Casos que iniciaram diálogos entre órgãos de igualdade racial, direitos humanos, a ANAC pra tratar destes protocolos. Mas é fato que, qualificar melhor os profissionais da aviação civil, do serviço aéreo, dos aeroportos e, sobretudo, a qualificação dos agentes de aviação das companhias aéreas é indispensável para isso. Há uma diferenciação no tratamento entre pessoas brancas e negras diariamente no serviço de aviação e as pessoas negras que usam este serviço com recorrência sentem essa diferenciação na prática, e não é sutil, é muito visível”, diz Yuri.
A advogada e professora da UNEB, Anhamoná Brito falou ao Portal Soteropreta sobre como o ocorrido poderia ter escalado para algo pior, como se costuma ver diariamente nos noticiários.
“Esta ocorrência poderia ter resultados mais gravosos, com violência física e, até mesmo, impedimento real do registro da reclamação. Sei que, enquanto mulher negra, o peso da raça direciona a forma como eu acesso serviços, oportunidades e exerço minhas liberdades, sempre numa perspectiva limitadora. Também compreendo que o meu ativismo político, conhecimento jurídico e acadêmico, além da própria rede de apoio que consigo acessar, me diferencia em possibilidades de resolver o problema, responsabilizando as pessoas e empresas envolvidas com a situação. Até mesmo por isso, tenho o compromisso político de não deixar esta situação cair na senda do esquecimento. Além da dimensão pedagógica aos que me atacaram, precisamos que casos emblemáticos imprimam uma nova ordem de mudanças, por um Brasil para todas as pessoas. O que só alcançaremos através de medidas que possibilitem, mais que a identificação de casos de racismo, a reversão deste triste legado da escravização”, diz Anhamoná.
Quem é Anhamoná Brito
Autora do livro “Manual avançado para atuação de conselheir@s tutelares”, Anhamoná Brito atuou em diferentes cargos públicos no estado da Bahia e na esfera federal, dentre eles o de Ouvidora Geral da Defensoria Pública do Estado da Bahia (2009/2011), Secretária de Políticas de Ações Afirmativas da SEPPIR, (2011/2012), Superintendente de Apoio e Defesa dos Direitos Humanos do Estado da Bahia (2015/2016); e Coordenadora Geral do Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas de Morte do Estado da Bahia (2020/2022). Sua primeira obra é voltada à reflexão, conscientização, informação e instrumentalização cidadã para a garantia e defesa de direitos de crianças e adolescentes. É advogada, ativista de Direitos Humanos e professora auxiliar do Colegiado de Direito da Universidade do Estado da Bahia – UNEB (Departamento de Ciências Humanas e Tecnologias – Campus XIX/Camaçari). É Doutora em Difusão do Conhecimento (análise cognitiva) pela UFBA e pesquisadora do Centro de Referência em Desenvolvimento e Humanidades (órgão suplementar da UNEB), do Grupo Enlace e do Grupo de Pesquisa “Trabalho Digno para o Homem do Campo), ambos da UNEB.