Connect with us

Perfil

Paulo Rogério Nunes – do Alto da Terezinha para o mundo

Jamile Menezes

Publicado

on

paulorogerionunes

paulorogerionunesEle é filho de Zenaide Nunes e Paulo Valentino, seus primeiros e maiores incentivadores. Em tudo. Deram a ele – e a seus irmãos – o melhor: na força, nos meios e na formação. Seu primeiro computador, por exemplo, foi um dos maiores esforços da família, pois viam nele um potencial de criatividade e de iniciativa.

Estamos falando de Paulo Rogério Nunes – publicitário, especialista em Política e Estratégia pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB) e em Jornalismo e Novas Mídias pela Universidade de Maryland (EUA). E não somente…

É cofundador do Instituto Mídia Étnica – que há 11 anos pauta a mídia negra no Brasil e no mundo – e tem apenas 35 anos de idade. Um jovem negro que teve, dentro de casa, a sua primeira referência empreendedora.

Aquele primeiro computador – lembra Paulo – também foi um dos primeiros do bairro do Alto da Terezinha, no subúrbio de Salvador, onde cresceu.  É irmão de Camila Evangelista e Yan Lucas.

O empreendedorismo começou na adolescência, produzindo um jornal (era Xerox mesmo) para circular na comunidade junto a sua prima Cintia Matos. Também alugava videogame para os colegas, produzia shows com os amigos, fazia camisetas grafitadas pra vender. Tudo isso lá em 1992-93.

Onde eu nasci não havia grupos culturais ou políticos de referência. O Subúrbio de Salvador é historicamente afastado desses movimentos, apesar disso vir melhorando nos últimos anos. Como todo bairro negro, pouca infraestrutura, mas ao mesmo tempo um senso de comunidade bem interessante. Ali cresci de uma maneira tranquila  e toda aquela experiência certamente moldou o que sou hoje.”

paulorogerionunes

Posse no Conselho Consultivo do Olodum

Na adolescência ainda, a consciência enquanto homem negro em Salvador chegou com a música. Foi no rap dos Racionais MCs que Paulo Rogério ouviu, pela primeira vez nomes como “Nelson Mandela, Spike Lee e Zumbi”.

Foi no ofício enquanto técnico de informática por seis anos, naquela época, que ele entendeu as desigualdades sociais. Era entre os bairros ricos de seus clientes e o retorno para casa que as comparações entre as realidades acionaram seu senso crítico. Mas foi no Instituto Steve Biko que as coisas começaram a fazer sentido.

Aqui começou sua trajetória militante, paralela à entrada na Universidade Católica (Ucsal), onde estudou Publicidade. “Comecei a circular mais no movimento negro, o que me ajudou a ter base para enfrentar os embates dentro da Universidade, onde participei de núcleos negros e dos debates pelas ações afirmativas”, diz.

paulorogerionunes

Com Spike Lee e o amigo Rosalvo Neto

“O fato de ter tido a oportunidade de conhecer Carlos Moore e outros intelectuais negros que circulavam na cidade me fez ter uma visão mais panafricanista e entender que o nosso problema não é local, mas internacional.”

O panafricanismo e a internacionalização desta pauta andaram juntos na influência do seu trabalho. Seu maior interesse: as produções feitas por negros na diáspora. No Brasil, Reino Unido, Canadá, Colômbia, EUA ou Alemanha, ou seja, toda experiência negra no mundo lhe interessa. Destaque para a comunicação, a tecnologia e a área dos negócios.

Detalhe: Paulo Rogério também é afiliado ao Berkman Center for Internet and Society da Universidade Harvard, onde dá consultoria em uma pesquisa sobre inclusão no meio digital.

Paulo também é o responsável por trazer a tecnologia VOJO para o Brasil. Desenvolvida por pesquisadores vinculados ao MIT Media Lab (EUA), a VOJO é um sistema que permite qualquer pessoa enviar reportagens para a Internet por telefone, mesmo que esta pessoa não tenha um smartphone. O lema desta tecnologia se encontra com o que pauta a vida de Paulo Rogério: “o futuro é vivido e não imaginado”.

paulorogerionunes

Seu interesse crescente pelo Afrofuturismo e a Cibercultura é mais do que visível. Em tudo que Paulo faz, comenta, posta, debate e produz, estas duas temáticas se encontram, lastreadas pela Comunicação. “Sigo muitos blogs, canais do YouTube e assisto a TEDx sobre esse assunto…ao mesmo tempo, gosto muito de história e política internacional.  E claro, muitas séries.”

No presente, o que ele está vendo e indica? Black Mirror – sobre os desafios da evolução tecnológica –  “Luke Cage”, um herói negro da Marvel que vive nas ruas do Harlem (EUA). O que ele lê? “Revista Piauí”, a “Meio e Mensagem”, “Super Interessante” e a “Exame”.

Livros? Ele adora biografias. “Agora mesmo estou lendo a do filho do Pablo Escobar, sobre essa loucura que foi os anos 80 na Colômbia. Antes, li um sobre os últimos anos do Rei Haile Selassie. Isso quando dá tempo, nessa loucura de trabalho e viagens”, conta. Estas últimas que, para ele, foram experiências libertadoras.

paulo rogerio nunes

Trono do imperador Haile Selassie

A Etiópia foi a que mais marcou Paulo Rogério, em 2011 e 2014. “Visitar a cidade sagrada de Lalibela, que tem quase mil anos, conhecer uma cultura tão diferente e ser acolhido em um local, por meu tipo físico, foi algo encantador”. também adorou Istambul, na Turquia – “uma cidade linda e muito diferente”.

Recentemente, esteve na Colômbia, onde foi tocado pela constatação de que lá, negros e negras estão ainda mais excluídos que aqui no Brasil. “Estas viagens foram fundamentais para ampliar minha perspectiva de vida, minha participação política. Essa nova geração que tá vindo tem que explorar o mundo, mesmo com pouco recurso, dá pra fazer muita coisa. Quando eu tinha 22 anos, essa ideia ficou na minha cabeça: a de que viajar era possível para uma pessoa negra e que era o que eu queria pra mim”, diz.

Poderia compartilhar mais destas experiências, não é, Paulo?

“Poderia escrever um livro de viagem..aliás, quando tiver mais velho devo fazer isso mesmo (risos)”.

Tempo é algo que Paulo tem buscado estender, até porque suas leituras, viagens e trabalhos entre Brasil e o mundo não parece mais caber na agenda. Hoje ele atua em duas frentes: consultoria para empresas na área de comunicação e a criação de um projeto chamado VALE DO DENDÊ. Entre ambas, uma meta comum: criar uma ponte entre o setor privado e a comunidade negra, unindo a publicidade e a comunicação.

Paulo enxerga já há algum tempo um “hiato” entre o que as empresas acreditam ser o desejo da população e o que realmente é. Em suas viagens e leituras ele já entendeu que conceitos como marketing multicultural e responsabilidade social são práticas bem consolidadas. Mas no Brasil…o hiato é ainda maior.

Ele quer atrair grandes investimentos sociais para Salvador e é com o VALE que pretende atingir esta meta. Aqui, ele é enfático: já viajou muito e é uma das coisas que mais gosta de fazer. Mas sair de Salvador não está nos planos deste jovem idealizador e realizador.

Com Al Dixon - um dos líderes do movimento pelos direitos civis nos EUA

Com Al Dixon – um dos líderes do movimento pelos direitos civis nos EUA

“Como bom baiano, quero viver em Salvador. Porém, percebi que por conta da falta de oportunidades muitas pessoas saem da cidade e cada vez mais vamos perdendo nossos talentos para outros estados do Brasil e do mundo. Então, quero criar uma espécie de escritório de atração de negócios que possa atrair para nossa cidade empresas e projetos inovadores para gerar oportunidade para nossa juventude que, infelizmente, é vítima desse genocídio diário. “

Tantos planos, trabalhos, protagonismos e idéias…dá tempo pro amor, pro prazer, pro lúdico? Tem que dar! Aqui um espaço para apresentar Keila Costa, por quem Paulo Rogério se diz grato, sortudo. “Uma companheira incrível, que me apoia e compartilha comigo uma mesma visão de mundo e personalidade. Uma mulher negra que também viveu muitas coisas que vivi, por nascer em uma comunidade pobre e ter batalhado para crescer profissionalmente”, se declara.

Paulo Rogério

Com Keila Costa, Carlos e Ayeola Moore

Eles estão casados há quase dois anos, se viram, pela primeira vez em 2004, na Ucsal e, desde então, tem sido uma presença marcante nesta trajetória que, sim, é de sucesso. “Fico feliz em poder apoiar os projetos dela e vice-versa”.

Paulo adora música – apesar de ter menos tempo para ela do que gostaria. Ele já passou do Rap ao Rock, do Jazz ao AfroBeat. Adora Mulatu Astatke – músico etíope que popularizou o EthioJazz  e tem especial atenção para a música árabe, de “sonoridade incrível”, diz.

paulorogerionunes7

Lançamento da edição do inverno da Revistas Americas Quarterly

Enquanto homem, negro, jovem, o que te inspira?

“Me inspira ver que há um oceano de possibilidades que ainda não foram navegadas…ver que podemos, sim, transformar muitas realidades se usarmos nossa criatividade e canalizarmos nossa energia para produzir soluções. Vejo que se motivarmos nossa juventude, podemos conseguir deixar um mundo melhor para as próximas gerações”.

paulorogerionunesO que te amedronta?

“Ver que ainda há tanto ódio no mundo e que muita gente fica tentando impor sua visão ao outro de maneira tão agressiva. Eu gosto muito de uma frase do poeta angolano Agostinho Neto quando ele diz “”Não basta que seja pura e justa a nossa causa, é necessário que a pureza e a justiça existam dentro de nós.”

Sobre, talvez, a experiência que deu a Paulo Rogério Nunes a experiência inicial para pavimentar todo esse caminho até aqui – o Instituto de Mídia Étnica -, uma certeza: é uma Escola. “ “É claro que nem tudo foi fácil, tivemos muitas dificuldades internas e também demorou para as pessoas de fora realmente entenderem o que nós estávamos tentando dizer, que é basicamente…”a comunicação é importante para qualquer militância política e será algo fundamental no futuro próximo…”.

“Somos o resultado desse mosaico de visões, ideias e percepções de mundo.  Hoje não estou mais na direção da organização e temos pessoas tocando os projetos. Estou dedicado a novas coisas, mas sempre conectado com o IME e compartilhando a mesma visão de que precisamos tornar as mídias mais plurais e representativas.” 

paulorogerionunes9

Integrantes do IME

Sobre o Afro Futuro de que Paulo tanto tem lido e se aproximado, uma deixa: “Estou trabalhando com o professor Hélio Santos e o jornalista Rosenildo Ferreira, colunista da Isto É Dinheiro, para fazermos um movimento semelhante ao que foi feito em Medellin, que era a cidade mais violenta do mundo no início dos anos 2000 e agora é considerada a mais inovadora. Queremos dialogar com o poder público, empresas e universidades, além da diáspora baiana que está pelo mundo e precisa voltar para nossa cidade tão bonita, mas que hoje é violentada”.

paulorogerionunes3

União Africana – Etiópia

Que o filho de Zenaide Nunes e Paulo Valentino tenha muito mais tempo pra compartilhar ainda mais de tudo que esse cérebro brilhante tem pra nos oferecer! “Por todos os meios necessários”.

Fotos: Acervo Pessoal

Mais Lidas

#NegrasRepresentam – ANAADI, negra, múltipla, das Artes!

Jamile Menezes

Publicado

on

ANAADI
ANAADI

Fto Raul Krebs

Que música é para aquecer nossos corações, não temos dúvidas. Explicar o que a música provoca é como escrever pra primeira paixão das nossas vidas. Aquele bilhetinho no auge do sentimento. E é assim que podemos descrever ANAADI, artista que muitos descrevem como a que canta o que compõe e compõe quando canta. Ela já cativou ouvidos de artistas como Rick Wakeman, Roberto Menescal, Ivan Lins e Ronaldo Bastos.

Destaque na segunda edição do programa The Voice Brasil, Anaadi é o que podemos considerar multi. Como produtora, idealizou o documentário “Arte das Musas?”, cujo destaque são as mulheres na Música. Sua atuação enquanto artista caminha ainda por composições para o documentário “Madrepérola”, que fala sobre  mulheres gordas, beleza e autoestima.

Portal Soteropreta – Como exatamente sua carreira se iniciou?

ANAADI – Minha carreira iniciou compondo canções, e mostrando pros amigos na escola e no cursinho pré-vestibular. Foi assim que fui descobrindo o potencial que tinha, de tocar as pessoas de alguma forma através da Música. Isso foi pelos 16 ou 17 anos, época que  comecei a dar canjas em bares de Jazz da minha cidade.Me formei em Psicologia em 2010, com essas experiências, eu aprendi o poder incrível de contar a própria história, e o quanto isso pode ser transformador tanto pra quem conta, como pra quem escuta. A vontade de fazer documentários veio muito daí. Da minha convivência com pessoas, da música. Sou apaixonada por autobiografias, por ouvir as histórias das pessoas no dia-a-dia, e quando consegui criar a oportunidade de ouvir tantas mulheres que vivem de música e para a música, fiz tudo para que essas histórias ganhassem espaço e chegassem a mais pessoas. Assim nasceu o “Arte das Musas?”. Participar do “Madrepérola” também foi incrível, e é até hoje. O que nos levou a  ganhar um prêmio de juri popular num festival de cinema em Chicago.

Portal Soteropreta – Você lembra quando sua trajetória a levou para produções que exaltam a beleza negra ou combate padrões vigentes?

ANAADI – Lembro sim. Foi em 2011, quando compus a música Sexyantagonista, que busca valorizar outros tipos de beleza, pra além do corpo e dos padrões físicos e comportamentais vigentes. Ela questiona o que é ser sexy. A partir dela, descobri que conseguia levantar essas questões através da minha música, então aos poucos fui compondo outras canções e investindo em outras produções que pudessem colaborar para a desconstrução de conceitos violentos contra as mulheres, por exemplo. O termo “Musa” é um conceito que a gente tenta desconstruir no meu filme “Arte das Musas?”. A gente tenta mostrar que as artistas da Música não têm vidas perfeitas nem nascem com um talento perfeito.

#NegrasRepresentam – Ilka Danusa, mulher de negócios, comunidades e sustentabilidade!

Tenho me unido com muitas mulheres negras que também se descobriram há pouco, e tem sido fantástico finalmente poder me ver no espelho através de outras mulheres, e admira-las, ama-las, chorar com elas, rir com elas. Acredito  que tem rolado um despertar coletivo, sabe? O Brasil parece estar vivendo um momento de despertar da população negra para a sua identidade, o seu valor e a possibilidade de trocas, aprendizados e crescimento juntos.

Portal Soteropreta – Como foi transitar por áreas diferentes das artes? Como você percebe esse impacto na sua atuação social?

ANAADI – Hoje a gente vive num mundo que pensa em rede, não pensa mais em linha. Consideramos muitas possibilidades ao mesmo tempo, e isso é interessante e libertador inclusive socialmente. A questão de ser uma mulher negra é cada vez mais importante no meu caminho artístico e na minha identidade, mas é uma descoberta recente, sabe? Eu não sabia que eu era uma “mulher negra” até 2016. Eu sabia que era uma mulher, e eu sabia que era negra. Ponto. Mas eu nunca tinha me dado conta de que eu vivo essas duas realidades ao mesmo tempo, inseparavelmente. Ou seja, que eu sou da única classe que sofre pelo machismo e pelo racismo ao mesmo tempo, e que pertenço a um grupo de mulheres que sofrem das mesmas aflições e compartilham tantas coisas que implica estar fora de uma rede de privilégios e ser destituído dos seus direitos.

#NegrasRepresentam – Renata Dias, preparada para repensar a Cultura!

 Enfim, a gente considera muitas possibilidades ao mesmo tempo, e todas existem dentro de seus contextos. Essa multiplicidade nos liberta de um padrão de pensamento muito limitante que dizia que tudo era A ou B.  Portando  unir diferentes formas de arte amplia os canais de discussão e dar mais visibilidade pras questões importantes pra a gente. Sendo múltiplo, transitando por mundos diferentes,  vamos encontrando novos jeitos de falar sobre o que precisamos falar.  Eu escolhi a música  e o cinema, outros escolhem a academia o que importa é que estamos falando.

 

 

 

Continue Reading

Entrevistas

#NegrasRepresentam – Luana Soares, feminista, militante e incentivadora!

Jamile Menezes

Publicado

on

luana_soares_negras_que_representam.2jpg

_negras_que_representam

Por meio de perfis, a campanha #NegrasRepresentam tem o objetivo de apresentar os pensamentos de mulheres negras em diversas esferas sociais e como suas ações vem propondo mudanças na realidade racial do país. Conheça Luana Soares:

Luana Soares é graduada em História pela Universidade Católica do Salvador e Especialista em Gestão de Políticas Públicas pela UNICAMP. Militante feminista e anti-racista, integra a Marcha Mundial de Mulheres e a Coordenação Nacional de Entidades Negras. Atualmente, compõe a equipe da Coordenação de Políticas para a Juventude, órgão do Governo do Estado da Bahia. Luana é uma destas mulheres que podemos considerar incentivadora e fiel a quem ela considera. Sempre se inspirando em mulheres que resistiram a modelos hostis e violentos, ela vem construindo uma trajetória de força e solidariedade.

Portal Soteropreta – Você é reconhecida por sua atuação na luta pelo direito das mulheres negras, em especial quando se trata de auto cuidado. O que lhe fez optar por esse caminho?

Luana Soares – Venho de uma família de mulheres muito fortes. Do tipo que resolve problemas de todo mundo, mas que dedica pouquíssimo tempo para si. Essa é uma realidade que é delas, uma realidade que é minha e de muitas mulheres negras e que Bell Hooks fala em Vivendo de Amor, a nossa forma de amar, a forma de amar das nossas mães é garantindo a sobrevivência. Somos ensinadas desde cedo que o nosso papel é cuidar, manter a vida girando, a dos filhos, a da comunidade, a dos homens. Então, parar pra cuidar de si, seja física ou psicologicamente e/ou espiritualmente é um ato de muita resistência. Foi observando essas mulheres e a mim que percebi que não nos cuidamos, não porque não queremos, mas porque nosso tempo é massacrado por um divisão sexual do trabalho que é cruel e marcada pelo racismo e machismo.

Portal Soteropreta – Comente um pouco das contribuições que você percebe sobre o sobre o pensamento feminista negro, esse campo de estudo e militância?
Luana Soares – Desnaturalizar violências. Harriet Tubman em seu discurso histórico, na verdade está falando sobre as mulheres a quem o cuidado (mesmo um cuidado de bases machistas) era destinado às outras para quem a violência era destinada e naturalizada. Então, me erguer contra essas violências, falar sobre elas, gritar, sair do papel de “Grand Mama” que a sociedade racista tenta imprimir as mulheres negras, é a principal contribuição do feminismo negro na minha vida. E certamente, a solidariedade. Veja, apenas acredito em uma sororidade não-branca, não-colonizada, então prefiro utilizar o termo Solidariedade de mulher preta pra mulher preta é um negócio surreal. É tangível, é prático, se insere na roda da solidariedade da classe operária e não tem nada a ver com gostar ou não da outra. Sai do romantismo e vai para o gás q acaba e a outra ajuda, é ficar com o filho pra outra poder trabalhar, é amparar na hora do aborto, feito sozinha, é o cabelo que precisa ser trançado pra trabalhar na casa dos brancos. É uma prática ancestral.

 

O que eu gostaria de deixar de questionamento é: as mesmas condições são oferecidas a nós e as mulheres brancas? Ou aos homens brancos e negros? A minha experiência pessoal diz que não. Então acho que temos combatido o silenciamento, estamos ocupando os espaços, mas me preocupa sob quais condições estamos adentrando.

#NegrasRepresentam – Campanha homenageia mulheres no Novembro Negro

Continue Reading

Perfil

#PoesiaSoteroPreta – A poesia problemática de Geilson de Andrade!

Avatar

Publicado

on

Geilson_dos_Reis_poesia_preta

Geilson_dos_Reis_poesia_preta

Poesia marginal e problemática é como o poeta Geilson de Andrade define sua produção artística, que inclui, ainda, peças de teatro e contos. Mas é na escrita e na récita que ele se encontra, se entrega.

De corpo e alma, em busca de atingir o psicológico de quem lhe ouve, ele faz um bombardeio de rimas, expressões corporais e faciais. É impossível vê-lo em atividade e não arrepiar, não sentir os olhos apertarem e o coração se angustiar. A verdade dói! Os primeiros versos tratavam de amor, questões existenciais e sobrenaturais, conflito entre vida e morte, durante a infância e adolescência, lá pelos 13 e os 15 anos de idade. Em 2010, já pesquisador de História, o veio de protesto e afirmação lhe tomou.

Os textos passam a expressar esta identidade que lhe acompanha desde então. Questões sócio raciais e referentes à opressão institucional assomam sua produção textual, toda escrita na tela de um computador. “Não lembro a última vez que usei papel e caneta”, assume Geilson.

Para além de válvula de escape, a poesia é, para Geilson de Andrade, “uma forma de conscientizar as pessoas, uma espécie de mecanismo educacional que desperte o pensamento e o sentimento das pessoas”. E complementa: “A poesia para mim é um veículo pedagógico e de resistência, utilizo o contexto histórico para situar o sujeito psicologicamente enquanto pessoa importante dentro da sua própria existência e resgate de valores”.

A fonte de inspiração é a família, tanto a biológica, normativa, mas, também, aquela que acolhe e abriga no seio da comunidade, seja a vizinhança ou a comunidade dos saraus, dos slams de poesia, os que pensam e defendem os direitos humanos. Este é o poeta, humano, Geilson Andrade.

Geilson_dos_Reis_poesia_preta

Sistema Nazista

Perdeu-se o brilho daquela esteira de estrelas

Que se estendia a caminhar tranquilamente sobre o asfalto

Os brotos morreram, as flores murcharam

Vidas foram ceifadas a flor da idade

Pela foice que corta, na frieza da morte

Por displicência da carne

Foi-se a juventude da alma

E perdeu-se o brilho e ofuscaram o asfalto

Mancharam de sangue coração dilaceraram

Caminhos tortuosos e destinos cruéis

Em meio a frágeis e poderosos

Injustiças entre vítimas e réus

Tenho que parar

Tenho que parar porque não cabe no poema

Esse triste cenário pobre miserável

De mentes estúpidas e corações insensatos

Me tirem desse sistema nazista

Sem perspectiva otimista

Sem que me tirem a vida

Sem que massacrem minhas crianças

Sem que prostituam as minhas meninas

Me tirem desse sistema tão ego

Me tirem desse sistema tão ísta

Por favor, favela

Me tirem desse sistema nazista

 

Continue Reading
Advertisement
Vídeo Sem Som

EM ALTA